CLÍNICAS CHINESAS FAZEM TERAPIAS ILEGAIS COM CÉLULAS-TRONCO



Pacientes de outros países, inclusive do Brasil, procuram clínicas chinesas em busca da promessa de cura de mal de Parkinson, diabetes, autismo e Esclerose Múltipla com uso de células-tronco. Pagam até US$ 8 mil para cada infusão das células, atraídos por anúncios na internet de clínicas instaladas em grandes complexos hospitalares, como os de Pequim e Xangai. Seria uma ótima notícia, se os tratamentos oferecidos não tivessem qualquer prova científica de sua eficácia, e o negócio irregular não fosse combatido pela próprio Ministério da Saúde chinês.

Tais tratamentos com células-tronco só existem em caráter experimental. Hoje, apenas algumas doenças do sangue têm a terapia com este tipo de célula comprovada cientificamente. O problema foi tema de denúncia publicada ontem pela revista "Nature" - um dos mais importantes periódicos científicos do mundo - que ouviu especialistas condenarem o uso de terapia com células-tronco sem auditoria técnica e alertarem que, para alguns casos, o tratamento pode trazer mais problemas aos pacientes.


Clínicas prometem tratar Alzheimer


De acordo com a revista, o ambiente das clínicas que prometem cura está longe de ter aspecto clandestino, e médicos e enfermeiras aparentemente estão convencidos de que podem ajudar seus pacientes. Uma estimativa feita em 2009 revelava que chegava a 100 o número de companhias que faziam uso de células-tronco na China. Há inclusive a descrição de uma delas, em Xangai, instalada em uma das áreas mais valorizadas da cidade, que vende tratamento com células-tronco do cordão umbilical ou do tecido adiposo para tratar Alzheimer, com até oito aplicações das células. Outra, na cidade de Changchun, informa ter tratado mais de 10 mil pacientes com o método. Já a Xangai WA Optimum Helth Care alega ter uma "aliança estratégica" com a Universidade de Harvard, nos EUA, mas tanto a escola de medicina quanto o instituto de células-tronco de Harvard alegam desconhecer qualquer ligação com a WA.

A pesquisadora Mayana Zatz, diretora do Instituto Nacional de Células-Tronco em Doenças Genéticas da USP, faz coro com a "Nature" e condena o que ocorre na China. Mayana afirma que apenas doenças do sangue, como leucemia, alguns tipos de anemia e talassemia, têm tratamento aprovado para humanos com uso de células-tronco.

- O que se faz nessas clínicas chinesas, ninguém sabe. Tem que se detalhar muito os métodos usados no tratamento, o que não ocorre. Na Alemanha, houve um caso semelhante, em que uma criança morreu em um tratamento de célula-tronco, mas a clínica foi fechada - conta a pesquisadora.

Além dos conflitos éticos que envolvem o uso de um tratamento que sequer tem seu método avaliado cientificamente - um dos efeitos colaterais pode ser o desenvolvimento de tumores -, Mayana destaca que a cobrança pelo serviço também é eticamente reprovável para tratamentos experimentais:

- Da forma como é feito, realmente pode-se chamar de negócio da China. Há sites na internet com tradução para o português para levar pacientes daqui.

Uma breve pesquisa na internet e é possível identificar brasileiros que se apresentam como representantes de clínicas chinesas para o tratamento de lesões cerebrais e disfunções musculares com células tronco. Uma das referências remete à página na internet da Beiko Biotech, com sede em Shenzhen. A empresa se apresenta como capaz de tratar paralisia cerebral e lesões no nervo ótico com as células. A clínica chinesa garante que as amostras de células-tronco são monitoradas por bancos de sangue indicados pelo governo.

Na rede social Orkut, há um fórum de pacientes brasileiros que trocam experiências e dão conselhos sobre a necessidade em buscar um intérprete para o inglês ou o mandarim antes de viajar. Na mesma página, um passo a passo informa sobre a importância de conseguir visto e autorização de uma instituição bancária para fazer remessa de dinheiro para o exterior.

Na China, segundo noticia a "Nature", o equivalente ao Ministério da Saúde no país asiático adotou desde janeiro um pacote de ações para reprimir a prática ilegal. Uma das medidas foi decretar moratória para novas clínicas de terapia com células-tronco até o segundo semestre e proibir as existentes de cobrarem pelo tratamento. Outra foi obrigar tais clínicas a registrarem suas atividades, métodos de pesquisa e procedência das células. Mas para a publicação americana, que dedicou um editorial para condenar a indústria ilegal, as medidas chinesas ainda não mostraram efeito.

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