ESTUDO PODE AJUDAR A INDENTIFICAR AS VERDADEIRAS ALTERAÇÕES GENÉTICAS ASSOCIADAS A DOENÇAS

19/03/2012 


Projeto 1.000 Genomas detalhou 95% das variantes genéticas.

Pessoas saudáveis carregam entre 200 e 800 mutações de perda de função.


O ser humano é uma máquina perfeita, gosta de pensar o vaidoso Homo sapiens. A análise genética de uma grande variedade de indivíduos, porém, mostra que não é bem assim. Mesmo quando exibe bom funcionamento, o corpo é repleto de "defeitos de fabricação". Uma equipe de cientistas descobriu que mutações que evitam a formação de proteínas essenciais ao organismo são comuns no genoma humano. A sorte é que, ainda assim, não desencadeiam males, conforme se imaginava.

De acordo com o líder da pesquisa, publicada recentemente na revista Science, a descoberta vai ajudar a identificar as verdadeiras variantes genéticas que podem estar associadas a doenças. Daniel MacArthur, geneticista do Instituto Wellcome Trust Sanger, do Reino Unido, explica que se costuma pensar que uma variedade de problemas de saúde pode ser debitada na conta das mutações de perda de função.

— Isso acontece quando o alelo não funciona como seu par, resultando na nulidade do desempenho do gene — afirma MacArthur.

Esse tipo de variante é, geralmente, descrito como rara e está associada a problemas graves, como fibrose cística e distrofia muscular de Duchenne. O que acontece, segundo o geneticista, é que estudos recentes vêm mostrando que pessoas saudáveis carregam entre 200 e 800 mutações de perda de função e, ainda assim, não têm qualquer doença.

Os cientistas tiveram acesso a dados do Projeto 1.000 Genomas, um mapeamento que já detalhou 95% das variantes genéticas — nem todas essas variações estão relacionadas a doenças e são elas que fazem uma pessoa ser completamente diferente da outra. A equipe de MacArthur se concentrou nas informações de 185 indivíduos saudáveis da América, da Ásia e da África. O geneticista Mark Gerstein, da Universidade de Yale, explica que a equipe se debruçou sobre 2.951 mutações de perda de função e, a partir de uma série de filtros técnicos, detectou que 56% delas não afetam tão gravemente o desempenho do gene. Também foi concluído que cada ser humano tem cerca de cem alelos sem função, acarretando em perda total de pelo menos 20 genes.

Com isso, os cientistas mostraram que nem toda variante que resulta na falha de produção de proteínas pode ser culpada pelo desenvolvimento de doenças genéticas.


Quadro realista


Por outro lado, o estudo não significa a redenção das mutações genéticas. Embora as variantes sejam de certa forma comuns e não representem riscos, aquelas mais raras, identificadas na pesquisa em apenas um dos indivíduos, são extremamente perigosas. Para Daniel MacArthur, ao descartar as mutações não relacionadas a doenças e se concentrar na caça àquelas que realmente significam riscos, os cientistas estão cada vez mais próximos do desenvolvimento de terapias personalizadas, que ataquem com precisão a causa de doenças genéticas. Esse, segundo ele, é o campo de ouro da medicina.

Em uma perspectiva sobre o estudo escrita para a Science, Lluis Quintana-Murci, pesquisador da Unidade de Evolução Genética do Instituto Pasteur, na França, destaca a importância dessa linha de pesquisa. "Dados obtidos pelo sequenciamento total do genoma de diversas populações humanas expostas a diferentes ambientes e apresentando diversos estilos de vida é que vão fornecer um quadro realista da extensão da variação genética do homem", escreveu. "Essas informações, aliadas ao papel desempenhado por cada mutação, como fez o trabalho de MacArthur, é que vão definir o real significado das variantes genéticas e seus possíveis riscos para as doenças."

Trabalhando na mesma linha do geneticista Daniel MacArthur, uma equipe da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, publicou um artigo no American Journal of Human Genetics defendendo que as mutações genéticas mais comuns encontradas no genoma humano dificilmente estão associadas a doenças. São aquelas mais raras que devem merecer a atenção dos pesquisadores.

O principal autor do artigo é David Goldstein, diretor do Centro de Variantes do Genoma Humano de Duke.

— Notamos que as variantes comuns não estão associadas a doenças. São análises consistentes com o que, aparentemente, está se tornando um consenso entre os pesquisadores. Quanto mais comum a variante, menos importante ela é — afirma Goldstein.

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