2.Abr.13 - 20:40 Atualizado em 13.Abr.13 - 17:52
A história do primeiro brasileiro que conseguiu melhorar dos sintomas da Esclerose Lateral Amiotrófica depois de se submeter a uma terapia pioneira com células-tronco.
Na semana que vem, os hematologistas Adelson Alves e Elíseo Sekiya, de São Paulo, irão revelar aos cientistas reunidos no congresso mundial da Sociedade Internacional de Terapia Celular, a ser realizado entre 21 e 25 de abril, na Nova Zelândia, as conquistas obtidas pelo agrônomo Henrique Dias, 68 anos. Ele é o primeiro paciente brasileiro tratado com infusões de células-tronco que obteve uma melhora importante de alguns sintomas da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). Degenerativa, a doença leva ao enfraquecimento muscular progressivo. Aos poucos, o paciente perde a capacidade de andar, falar e até de deglutir. Em geral, a morte ocorre três anos e meio após sua manifestação. O trabalho descrevendo o tratamento de Henrique será publicado na revista científica “Cytotherapy”.
CONQUISTAS
Henrique voltou a falar com mais clareza e fazer movimentos com o braço direito
Não se conhecem ao certo as causas da doença, mas sabe-se que os
prejuízos são resultado da morte gradual dos neurônios envolvidos no
controle motor do organismo. Por essa razão, desde a intensificação das
pesquisas com células-tronco, essas estruturas passaram a figurar como
uma possibilidade de tratamento contra a enfermidade. Dotadas da
capacidade de se transformar em outros tipos de células, a esperança é
de que, uma vez alojadas no local onde a morte neuronal ocorre, elas
possam, de alguma forma, melhorar a comunicação entre as células que
restaram.
Há no mundo alguns protocolos de estudo usando células-tronco contra a
doença – um deles é o da respeitada Clínica Mayo, nos EUA. O caso do
brasileiro chama a atenção por trazer à vista benefícios significativos
desse gênero de terapia. Desde outubro do ano passado, quando tomou a
terceira infusão de células-tronco, Henrique vem mantendo as melhoras
advindas do tratamento. Uma delas foi voltar a falar com clareza.
“Antes, eu falava tão enrolado que as pessoas tinham dificuldade de
entender. E não movimentava mais os braços”, diz. Hoje, 16 meses depois
da primeira aplicação, o agrônomo atende o celular, segura e aciona os
controles da tevê e digita no computador. Além disso, com apoio de outra
pessoa, consegue dar alguns passos.
Diagnosticado em 2006, ele decidiu fazer todos os tratamentos
conhecidos e, por fim, saiu à procura de terapias com células-tronco.
Por sugestão de um dos três filhos, Henrique procurou o hematologista
Adelson Alves, que está à frente da CordCell, um banco de armazenamento
de células do cordão umbilical onde funciona também um centro de
pesquisas de terapia celular. Como não existem trabalhos conclusivos
sobre a terapia celular contra a enfermidade, os pesquisadores pediram a
autorização de comitês de ética para ministrá-la a Henrique. A
aprovação foi dada para três aplicações em caráter compassivo, ou seja,
quando não há mais outro tratamento.
A primeira infusão levou para dentro do corpo do agrônomo dez milhões
de células-tronco mesenquimais, que podem se diferenciar em tecidos
ósseos, cardíacos, conjuntivos e nervosos. Foram extraídas do tecido
gorduroso do próprio Henrique (obtidos por uma minilipoaspiração no
abdome) e multiplicadas em laboratório. Depois, foram injetadas no canal
de sua medula óssea, onde circula o líquor, líquido presente no
cérebro. “Nessa fase, observamos a segurança e possíveis efeitos
colaterais”, diz o hematologista Sekiya.
Emocionado, Henrique conta que, na primeira semana após essa infusão,
ele se levantou sozinho da cadeira e ensaiou alguns passos, mas a
melhora foi passageira. Ficou em observação até setembro, quando recebeu
nova dose, desta vez de 50 milhões de células. Um mês depois, foram
mais 100 milhões. “Desde então, mantenho as melhoras em movimentos da
mão direita e da fala. É a primeira luz no fim do túnel que vejo desde
que fui diagnosticado”, conta Henrique. Os pesquisadores estão avaliando
com exames clínicos e de imagem como as células-tronco promoveram a
melhora.
A esperança dos especialistas no poder dessas estruturas é
proporcional à sua cautela. “É fundamental avançar no estudo da
qualidade e das vias de infusão das células-tronco”, diz a geneticista
Mayana Zatz, da Universidade de São Paulo. Há dois anos, a cientista
aplicou em pacientes com a doença células mesenquimais tiradas da sua
gordura. “Não vimos melhora. Mas era uma tentativa e precisava ser
aprimorada. Nesse campo, há muitas perguntas a serem respondidas.”
AVANÇO
O hematologista Adelson Alves liderou o protocolo
de estudo que beneficiou o paciente Henrique
Uma delas é sobre a frequência das aplicações. As experiências feitas até agora indicam que infusões repetidas podem melhorar a condição das células nervosas. “Parece que elas se comunicam melhor, mas não se sabe por quais mecanismos”, diz o neurologista Acary Oliveira, especialista em doenças neuromusculares da Universidade Federal de São Paulo. “As notícias de bons resultados com as células-tronco em pacientes de ELA renovam esperanças, mas é importante dizer que isso ainda não é um é tratamento”, lembra o médico.
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