23/10/2012
Problemas na escola podem esconder doenças graves como dislexia ou TDAH .
Inquietação, questionamento excessivo, dificuldade na escola e falta de paciência podem indicar que a criança está sofrendo.
Inquietação, questionamento excessivo, dificuldade de prestar atenção
na aula, distrair-se facilmente e ficar disperso quando o professor
explica a matéria. Pouca paciência para estudar, capacidade de fazer
várias coisas ao mesmo tempo e dificuldade de terminá-las. São
características comuns, mas que podem esconder uma criança infeliz, com
problemas para lidar com as próprias tarefas e dona de um diagnóstico
cada vez mais comum: o TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com
Hiperatividade).
Ao lado da conhecida dislexia (dificuldade na leitura e escrita), o
TDAH é um dos principais transtornos ligados à aprendizagem. Presente em
cerca de 5% da população, a doença é baseada em três itens principais:
desatenção, hiperatividade e impulsividade, e costuma ser mais evidente
em meninos do que meninas, alerta a psicóloga Cleide Partel:
— Os meninos enquanto crianças são mais percebidos, já que as meninas
são as mais quietinhas e podem passar despercebidas pelos professores.
Na idade adulta, no entanto, a proporção é de um homem diagnosticado
para cada mulher.
A dificuldade, conta a especialista, surge de atividades demandadas
pela escola. Quando a criança está lendo um livro, por exemplo, consegue
chegar ao final da página, mas não lembra o que leu e sempre tem de
voltar ao início. Além disso, como não suporta tédio ou tarefas
burocráticas e sem criatividade, quem sofre de TDAH foca a atenção
somente quando gosta do assunto ou quando é desafiado. Assim, para as
matérias que não tem tanto interesse terá de fazer um esforço muito
maior do que os outros.
Além dos problemas na vida escolar, a vida profissional também pode acabar prejudicada, explica Cleide:
— É muito comum que seja uma pessoa extremamente impaciente e queira
fazer tudo do jeito dela, no tempo dela. Então, costumam não esperar sua
vez e querem impor aos outros suas próprias regras. Além disso, mal
conseguem esperar o interlocutor terminar de falar e costumam agir por
impulsividade, comendo e bebendo muito.
Para a pediatra Maria Aparecida Moyses, que coordena o Laboratório de
Estudos sobre
Aprendizagem, Desenvolvimento e Direitos do Centro de
Investigações em Pediatria da Unicamp (Universidade Estadual de
Campinas), mais do que um diagnóstico, essas características mostram que
a criança vem enfrentando sérios problemas:
— São manifestações de que algo não vai bem com essa criança e que
podem esconder um problema real que não está sendo diagnosticado, como a
dislexia.
TDAH X dislexia
O transtorno, no entanto, não deve ser confundido com a dislexia.
Enquanto o TDAH se refere ao comportamento e tarefas executivas, a
dislexia tem relação com a capacidade de leitura e escrita que interfere
diretamente na aprendizagem. Normalmente, quem sofre com a doença,
troca ou omite letras e números com frequência. Assim, explica o
pediatra Dr. Saul Cypel, membro do Departamento Científico de Pediatria
do Comportamento e Desenvolvimento da SBP (Sociedade Brasileira de
Pediatria), a doença costuma ser diagnosticada quando a criança começa a
aprender a ler e escrever:
— A dislexia é um processo de dificuldade severa do aprendizado da
leitura, que só pode ser verificada com pelo menos dois anos de
alfabetização.
Pais que se veem diante de um filho diagnosticado com dislexia ou TDAH e
que está tendo dificuldades para acompanhar o ritmo dos colegas podem
se ver às voltas com a seguinte dúvida: é preciso uma escola especial
para meu filho? Especialistas, no entanto, são categóricos ao dizer que a
resposta é “não”. Eles ressaltam que a maior parte das escolas tem
condições de trabalhar em conjunto com os pais e o médico que trata da
criança para encontrar soluções às dificuldades cotidianas.
Sem contar que uma escola especial, ressalta Cleide, pode trazer
estigmas e fazer com que a criança comece a ser vista como diferente.
Identificação
Diferentemente de muitas doenças neurológicas, o TDAH conta apenas com
um questionário de 18 perguntas recomendado pela Associação Americana de
Psiquiatria para ser diagnosticado. Para saber se a criança tem TDAH é
preciso que os pais fiquem atentos aos seguintes pontos: se seu filho
está atrapalhando a aula, se vai mal na escola, se sempre desafia ou
enfrenta mais velhos e autoridades, se é uma criança difícil de lidar.
Nos adultos, pode haver dificuldade de concentração em palestras, aulas
ou leitura, desatenção, relutância em iniciar tarefas que exigem longo
esforço mental, problemas com organização, planejamento ou mesmo memória
a curto prazo (marcada pela perda ou esquecimento de objetos, nomes,
prazos, datas). Além disso, pode vir associado a outras doenças como
depressão, transtorno de ansiedade ou distúrbio alimentar.
Uma vez confirmada a existência da doença, no entanto, é importante
recorrer a um tratamento multidisciplinar, assessorado por médicos,
psicoterapia, orientação aos pais e professores. Quando há necessidade
do uso de medicamento — em geral o metilfenidato, comercializado sob o
nome de Ritalina —, este deve ser prescrito com bastante critério. O medicamento, alerta Maria Aparecida, é cada vez mais vendido no Brasil, que é atualmente é o segundo maior consumidor do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos:
— A ritalina age como a anfetamina e a cocaína, aumentando a dopamina
(neurotransmissor do prazer) nas sinapses e diminuindo a sensibilidade.
Além disso, quando mal administrado, o remédio pode causar alucinação,
depressão, convulsão, insônia, confusão mental, levar à perda de peso e
atrapalhar o crescimento. A própria bula do remédio indica que ele não
deve ser utilizado em crianças menores de seis anos.
O pediatra Dr. Cypel ressalta que o medicamento é uma opção muito
criteriosa e eventual, mas que não isenta os pais de rever o processo de
desenvolvimento e educação do filho.
— Os pais têm de entender que não podem fazer todos os desejos da
criança. Além disso, precisam estimulá-las a conviver com frustrações e
mostrar que elas têm tarefas, assim como rotina e horários.
Mas atenção: tentar impor uma lista de cobranças à criança pode apenas
agravar a doença. Os pais, de acordo com Cleide, devem aprender a não
criticar sempre a criança por seus erros e passar a ressaltar com mais
frequência os acertos.
— Do contrário, a criança perceberá que recebe muita atenção dos pais
quando faz coisas inadequadas, e isso fará seu comportamento ficar pior.
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