A PÍLULA QUE PREVINE O HIV
SAÚDE 18 de janeiro de 2014
 
  
Enquanto tomava chá em um café no centro da cidade, Michael Rubio 
lembrava que quatro de seus amigos tornaram-se portadores do HIV no 
período de um ano por praticarem sexo sem proteção. O fato abalou Rubio,
 um homossexual de 28 anos, e o fez experimentar uma forma nova de 
prevenção do HIV: um comprimido de uso diário que demonstrou ser 
altamente eficaz na proteção contra a infecção.
– Depois que meu 
círculo de amizades foi bastante afetado no ano passado, não tive 
dúvidas na hora de decidir isso para minha vida – afirmou Rubio, 
coordenador do Positive Resource Center, uma agência de serviços sociais
 para pessoas com HIV.
Muitos especialistas da área de saúde 
esperavam que o Truvada – medicamento que é uma combinação de dois 
antivirais que vinham sendo usados desde 2004 no tratamento contra o HIV
 – fosse amplamente utilizado por homens gays sem o vírus.
Em vez
 disso, o Truvada tem demorado a se popularizar desde a sua aprovação 
pelo FDA (órgão que fiscaliza alimentos e medicamentos nos Estados 
Unidos) como estratégia de prevenção há 18 meses. A ideia de 
homossexuais saudáveis do sexo masculino terem de tomar a medicação para
 evitar a infecção – abordagem chamada de profilaxia pré-exposição – foi
 recebida com indiferença por camadas da população.
– O remédio 
recebeu bastante atenção como um novo recurso de prevenção em encontros 
sobre o HIV e eu o considero uma opção importante. Todavia, meus 
pacientes têm demonstrado muito pouco interesse. Existe uma 
incongruência intrigante – afirmou Lisa Capaldini, médica de San 
Francisco, que atende muitos homens gays.
Durante 30 anos, as 
autoridades de saúde pública promoveram de forma assertiva o uso da 
camisinha em toda a prática sexual – como o único método eficiente de 
prevenir a transmissão do HIV, com exceção da abstinência. Entretanto, 
50 mil casos novos surgem todos os anos nos Estados Unidos, e a 
transmissão pela relação sexual entre homens corresponde a mais da 
metade dessas infecções.
Opção trouxe, ao mesmo tempo, esperança e confusão
Muitos
 especialistas afirmam que o Truvada é uma oportunidade de reduzir o 
número de novas transmissões em grupos de alto risco, como jovens 
homossexuais, pessoais cujos parceiros são portadores do HIV e 
prostitutas. O FDA exigiu que as prescrições fossem acompanhadas de 
orientações, testes frequentes de HIV e da promoção contínua do sexo 
seguro, mesmo que as pesquisas sugiram que apenas o uso diário do 
remédio ofereça proteção quase total.
Para muitos homens 
homossexuais, e para algumas autoridades de saúde pública, a nova opção 
trouxe ao mesmo tempo esperança e confusão.
– Durante várias 
décadas, a recomendação era para o uso de camisinha. Agora, estamos 
dizendo: “aqui está o comprimido que pode protegê-lo caso você não use 
camisinha”. E isso vem de encontro às normas da comunidade – afirmou 
Kenneth H. Mayer, professor de Medicina da Universidade Harvard e 
diretor de pesquisa médica do Fenway Health, um centro comunitário de 
Boston que tem diversos pacientes gays e lésbicas.
 
 
MUDANÇA DE ATITUDE
 
De acordo com a análise produzida pela Gilead Sciences, empresa de 
biotecnologia que produz o medicamento, os dados obtidos por mais da 
metade das farmácias do país indicam que, de janeiro de 2011 a março de 
2013, 1.774 pessoas apresentaram prescrições do Truvada (o medicamento 
podia ser prescrito antes da aprovação pelo FDA). 
 
Quase metade das 
prescrições foi feita para mulheres, o que surpreendeu os que esperavam 
que os homossexuais do sexo masculino fossem os primeiros a usar o 
medicamento. A médica Deborah Cohan, obstetra e ginecologista da 
Universidade da Califórnia, em San Francisco, prescreveu o medicamento 
para várias mulheres cujos parceiros eram portadores do HIV, inclusive 
uma paciente que queria engravidar.
Embora sejam raros, os 
possíveis efeitos colaterais, como danos aos rins e perda da densidade 
óssea, também preocupam. Além disso, o Truvada custa caro, mais de US$ 1
 mil ao mês. Até o momento, companhias de seguros privadas e públicas, 
incluindo os programas de assistência Medicaid, forneceram o remédio 
como prevenção.
Contudo, a mudança de atitude em relação ao HIV 
da nova geração de homens gays talvez tenha contribuído, afirmam alguns 
especialistas. Com os avanços do tratamento, muitos jovens gays do sexo 
masculino que não viveram durante os piores anos da epidemia têm menos 
medo das consequências da infecção. Além disso, os medicamentos atuais 
conseguem baixar os níveis do vírus de portadores do HIV a ponto de 
tornar desprezível o risco de transmissão, o que reduz ainda mais a 
percepção sobre a necessidade de profilaxia pré-exposição dos parceiros 
sem o vírus.
Damon Jacobs, psicoterapeuta de Nova York, começou a tomar o Truvada após sair de um relacionamento estável.
–
 Descobri que não estava sendo tão fiel ao uso da camisinha quanto eu 
era no passado e isso me deixou bastante assustado – afirmou Jacobs, 42 
anos.
Confissões como essa deixam apreensivos alguns 
especialistas de saúde pública, apesar da eficácia comprovada do Truvada
 se usado diariamente. A AIDS Healthcare Foundation, importante 
provedora de serviços de saúde relacionados ao HIV, com sede em Los 
Angeles, intercedeu contra a aprovação do Truvada como prevenção, 
argumentando que, ao tomarem o remédio, os homens estariam mais 
propensos a práticas sexuais mais arriscadas.
 
 
 
 
          
      
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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