21.Set.12 - 21:00
| Atualizado em 23.Set.12 - 09:22
Pesquisas revelam que a atividade física melhora concentração, memória, aprendizagem e estimula o nascimento de neurônios.
Não é segredo que a atividade física produz inúmeros benefícios para o
corpo, mas agora a ciência reuniu provas suficientes para adicionar um
novo e poderoso efeito à sua lista de ações positivas: o aprimoramento
do cérebro. As mais recentes descobertas indicam que a prática regular
de exercícios ajuda a pensar com mais clareza, melhora a memória e
proporciona um grande ganho na aprendizagem. Novos estudos sugerem que
as mudanças podem ser ainda maiores, alterando a própria estrutura do
órgão ao incentivar o nascimento e o desenvolvimento de neurônios.
Essas conclusões são de uma ampla revisão de pesquisas que acaba de ser
divulgada nos Estados Unidos por uma das mais renomadas cientistas no
campo da neurogênese, Henriette van Praag (Ph.D), do Laboratório de
Neurociências do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos.
Henriette e seus colaboradores afirmam que há maior produção de
neurônios e um aumento das substâncias que atuam na nutrição e
desenvolvimento dessas células em animais submetidos a exercícios
regulares. O trabalho foi publicado pela revista “Current Topics in
Behavioral Neurosciences”. A cientista detectou ainda que o exercício
aumenta a capacidade do cérebro de se adaptar e criar novas conexões, a
chamada neuroplasticidade. Em estudos com ressonância magnética feitos
em indivíduos foi possível também observar que quem se exercita
regularmente produz uma intensa atividade no hipocampo. Essa região
cerebral está relacionada à memória e à aprendizagem, e lá estão
armazenadas as células-tronco que darão origem aos novos neurônios.
As relações entre exercícios e cérebro estão no centro das atenções da
neurociência por suas implicações imediatas e futuras na vida de
milhares de pessoas. Há avanços em diversas frentes. Os cientistas
comprovaram, por exemplo, que as vantagens começam com a elevação dos
níveis de oxigenação e do fluxo sanguíneo no corpo como um todo. “Por si
só essa mudança já melhora o funcionamento da memória e da concentração
e previne o acidente vascular cerebral”, explica Gisele Sampaio Silva,
gerente-médica do programa integrado de neurologia do Hospital Albert
Einstein e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O incremento da circulação também estimula a comunicação mais eficiente
entre os neurônios. A atividade física aumenta ainda a produção e a
liberação de neurotransmissores. “Esses hormônios fabricados pelos
neurônios atuam nas sinapses, a comunicação entre essas células”,
explica Ricardo Arida, professor e pesquisador do Departamento de
Fisiologia da Unifesp. Esses compostos participam da regulação de
funções como memória, aprendizagem, emoções, sede, sono, fome,
bem-estar, ansiedade e humor. O resultado é um reequilíbrio das
quantidades dessas substâncias no cérebro, compensando déficits ou
excessos, o que melhora o desempenho global do órgão.
Numerosos estudos estão focados na compreensão dos efeitos do
exercício na proteína BDNF, uma espécie de tônico do surgimento,
crescimento e especialização das células nervosas. Um trabalho
coordenado pelo neurofisiologista Arida, da Unifesp, mediu a
concentração dessa proteína no sangue de atletas internacionais, de
nacionais e de pessoas sedentárias. As conclusões, publicadas na revista
“Neuroscience Bulletin”, revelaram que os atletas de mais alto nível
tinham quantidades maiores do composto circulando no sangue. Uma das
prerrogativas da proteína é melhorar a troca de mensagens entre os
neurônios.
Crianças também podem vir a se beneficiar intelectualmente da atividade
física, conforme sugerem dados colhidos pela Unifesp. Os pesquisadores
analisaram as respostas de animais à ginástica logo após o desmame.
“Nossos achados sugerem que fazer exercícios desde cedo ajuda a
construir uma reserva neural que protege, inclusive, contra desordens
cerebrais”, afirma Arida. Na Universidade de Darthmouth, em New
Hampshire, o grupo do cientista David Bucci detectou diferenças nos
resultados de quem começa a se exercitar na infância, na juventude ou
mais tarde. “O exercício na fase de desenvolvimento do cérebro favorece
a formação de uma rede neuronal mais densa e oferece mais apoio para
funções como memória e aprendizagem”, disse o pesquisador à ISTOÉ.
Nos Estados Unidos, essas informações estão se traduzindo em mudanças no
currículo das escolas. Um dos responsáveis por essa transformação é o
neuropsiquiatra John Ratey, da Universidade de Harvard. Ele percorre o
país para promover a adoção de programas de fitness voltados para o
aprendizado. O pesquisador partiu nessa cruzada convencido por suas
pesquisas e por casos como o dos alunos da Naperville Central High
School, situada em um distrito de Chicago. Ali, os estudantes se reúnem
na escola todas as manhãs antes das aulas, colocam seus frequencímetros
(relógios que calculam a frequência cardíaca) e saem correndo em uma
pista. “A ideia principal é que os jovens consigam praticar atividades
como a corrida mantendo uma taxa entre 65% e 80% de sua frequência
cardíaca máxima, mantendo-a estável nessa faixa por 20 a 40 minutos três
vezes por semana”, disse Ratey à ISTOÉ. Ele registrou essa experiência e
outros estudos sobre a relação entre cérebro e exercício no livro
“Corpo Ativo, Mente Desperta” (Ed. Objetiva), lançado recentemente no
Brasil. No ano passado, o pesquisador ofereceu um programa de apoio com
atividades físicas a 24 jovens do Ensino Médio com sérios problemas
disciplinares, baixa frequência às aulas e dificuldades de aprendizagem
da escola Barrie Central. “Em seis meses a melhora foi notável”, disse o
neuropsiquiatra. Em breve Ratey irá à Coreia do Sul a convite do
Ministério da Educação para falar sobre os efeitos do exercício no
cérebro. Diante dessa nova abordagem da atividade física, escolas
brasileiras já estão começando a rever a pauta das suas aulas de
ginástica. No Colégio Ítaca, na zona oeste de São Paulo, o currículo de
educação física foi reelaborado sob esse prisma. “Além de contribuir em
várias áreas do conhecimento, o exercício é uma peça fundamental para a
concentração”, diz Elisabete Vecchiato, assessora cultural do colégio.
Muitos estudos ainda são necessários para determinar, por exemplo, como
surgem e por quanto tempo persistem as alterações induzidas pela
ginástica. “Os primeiros efeitos podem ser sentidos após uma semana”,
diz Arida, da Unifesp. A recomendação é que se façam três sessões de 20 a
30 minutos de exercícios aeróbios por semana, mas duas já produzem
algum efeito. O entusiasmado pesquisador Ratey, de Harvard, tem sugerido
aos professores de educação física que ofereçam sessões de ginástica
duas vezes por dia, uma antes do início das aulas, e outra no final,
para produzir dois momentos de pico na produção das substâncias que
melhoram o desempenho. “Minha convicção é que o foco no condicionamento
físico tem um papel essencial nas realizações acadêmicas dos alunos”,
afirma ele.
Por hora, é consenso que a interrupção da atividade física cessa suas
benesses. A avaliação de resultados de longo prazo, porém, está levando
os especialistas a considerar a possibilidade de a prática persistente
gerar mudanças estruturais no órgão. Pesquisa da Universidade de
Pittsburgh, nos Estados Unidos, mostrou um aumento do tamanho do
hipocampo (associado a aprendizagem e memória) em adultos saudáveis após
um ano de atividade física moderada, levando a um aprimoramento da
memória. “Os resultados desse estudo são interessantes porque mostram
que exercícios feitos por adultos mais velhos e sedentários, mesmo que
em pouca quantidade, podem levar a uma substancial melhora da saúde
cerebral”, disse Art Kramer, um dos autores do trabalho realizado em
conjunto com outras universidades.
Buscam-se também explicações para as respostas diferentes que o cérebro
dá quando o corpo se exercita. A equipe do professor David Bucci
revelou recentemente a presença de um gene que parece regular a
intensidade da reação do órgão. A descoberta pode ser especialmente útil
para ajudar a selecionar, no futuro, quem pode lucrar mais ao associar a
atividade física ao tratamento de condições como depressão, a ansiedade
e o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDHA). Essas
aplicações estão sendo estudadas em centros como o Instituto Karolinska,
na Suécia. “O exercício não só é eficiente no combate à depressão, como
potencializa os efeitos dos medicamentos”, diz a neurocientista Astrid
Bjornebekk. Ambos contribuem para a formação de novos neurônios em áreas
no cérebro importantes para a memória e a capacidade de aprender e
podem ser usados de maneira combinada. Em São Paulo, na Unifesp, o
pesquisador Arida concluiu que a ginástica pode ajudar a reduzir pela
metade as crises de epilepsia, doença tratada com medicamentos potentes e
nem sempre eficazes. À luz dessas descobertas, o sedentarismo torna-se
um fator de risco ainda mais perigoso.
INVESTIGAÇÃO
O pesquisador Ricardo Arida, da Unifesp, estuda o impacto da
atividade física sobre o cérebro. Um de seus trabalhos
mostrou que exercícios podem reduzir crises de epilepsia
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GRATO.
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