ELIMINAR DO ORGANISMO A BACTÉRIA CAUSADORA DA GASTRITE ALIVIA OS SINTOMAS DA DOENÇA,QUE NÃO TEM CURA

07/02/2012


Gastrite atinge 40% da população mundial.

Controversa entre especialistas, medida teve eficácia demonstrada em pesquisa conduzida pelo Hospital de Clínicas, em Porto Alegre.


Algo deu errado, e você sente o estômago pegar fogo. Se a cena lhe parece familiar, não se desespere: você não está sozinho. Especialistas calculam que quatro em cada 10 brasileiros padeçam de pelo menos um dos sintomas de dispepsia (que em grego significa "difícil digestão"), doença conhecida como gastrite. No mundo todo, segundo o Journal of Clinical Gastroenterology, mais de 40% da população mundial sofre do mal.


Em situações normais, quando o alimento é ingerido, ele passa pelo esôfago e entra no estômago, onde um ácido ajuda no processo de digerir a comida. Tudo ocorre tranquilamente. O mesmo não ocorre no estômago dispéptico. Devido a diversas causas — sendo algumas impossíveis de serem identificadas — ocorre uma espécie de destruição de uma camada protetora no estômago, permitindo que o ácido altere a sua função. Aí, surge uma série de sintomas. E isso dói — e como dói.


Se você é do grupo dos que costumam sentir dores e queimação no estômago, sensação de que comeu demais sem ter comido muito (saciedade precoce), estofamento, refluxo, náuseas e vômitos, é provável que você já tenha recebido diagnóstico da dispepsia, que se divide em dois grupos. O primeiro é dos dispépticos funcionais — que desenvolvem a popular "gastrite nervosa" e podem ser, ou não, portadores da bactéria Helicobacter pylori, e nos quais não são identificadas outras doenças nos exames complementares. O segundo é o grupo dos pacientes que têm alterações anatômicas, como úlceras ou câncer do estômago, e que são chamados dispépticos "orgânicos". Mas é no grupo dos dispépticos funcionais, os pacientes com "gastrite", que as pesquisas científicas avançam com mais intensidade — e muito disso se deve a estudiosos gaúchos.


Após décadas de controvérsias entre médicos, que se dividem sobre a eficácia de erradicar, ou não, a pylori com antibióticos nos pacientes com dispepsia funcional e que sejam portadores da bactéria (nos pacientes com úlceras, a erradicação do Helicobacter pylori é obrigatória), hoje já se pode dizer que dar fim a este microorganismo faz sentido.


De maneira geral, recorda o gastroenterologista Luiz Edmundo Mazzoleni, os médicos que são a favor da eliminação da bactéria acreditam que isso possa melhorar os sintomas. Os que são contra a erradicação alegam que isso não melhora os sintomas e que a eliminação da bactéria poderia provocar a Doença do Refluxo e alterações imunológicas.


Uma equipe médica de mais de 50 profissionais vinculados ao Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) concluiu que é válido tratar quem tenha esta bactéria em um estudo inédito, realizado com 842 pacientes com dispepsia não investigada, entre 2006 e 2009. O trabalho foi publicado na revista Archives of Internal Medicine, novembro passado, e ganhou repercussão mundial.


Ao submeter os voluntários a endoscopias e tratamentos, descobrimos que vale a pena, sim, erradicar a bactéria com antibióticos. A equipe chegou à conclusão de que uma boa parcela de pacientes se beneficiava com o tratamento — comemora Mazzoleni, coordenador do estudo, lembrando que a infecção pelo H. pylori é apontada como principal causa das úlceras do estômago e do duodeno (92%), podendo, em raros casos, evoluir ao câncer gástrico, o segundo mais frequente no mundo.


A descoberta, além de desmistificar o tema, deverá servir de aporte para que os médicos prescrevam antibióticos e tratem a Helicobacter pylori nos dispépticos funcionais, ainda que não haja um consenso total entre os médicos sobre o assunto. De acordo Laércio Tenório Ribeiro, membro da Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG), as controvérsias sobre a abordagem terapêutica para todos os infectados variam. Por enquanto, é cedo para dar como encerrada a discussão sobre a interação do nosso organismo com a bactéria.


Será que sua presença é sempre prejudicial ou em alguns casos, onde não ocorre interferência mensurável na condição de saúde, poderia atuar como agente simbiótico? Qual sua importância no equilíbrio do nosso sistema imunológico? Há muitas perguntas ainda sem resposta. O mais comum é, caso a gastrite seja confirmada, utilizar o tratamento com medicamentos que inibem a secreção de ácido pelo estômago, desta forma diminuindo a agressão à mucosa — afirma Ribeiro.


Um incômodo ainda sem cura

As pessoas que sofrem da chamada dispepsia funcional, popularmente chamada de gastrite nervosa, podem ser, ou não, possuidoras da bactéria Helicobacter pylori — o que equivale a 34% do total de casos estudados na pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.


Para os que não possuem a bactéria, a notícia não é nada animadora: não há muito o que fazer senão cuidar da qualidade da alimentação e manter a mente em dia, já que as emoções interferem no bom funcionamento do estômago.


O problema no tratamento é que a medicina ainda não conseguiu medicamentos totalmente eficientes para corrigir os distúrbios da função do trato digestivo. E é por isso que as pessoas sofrem tão cronicamente com essas doenças funcionais a vida toda. É um problema mais complexo, que ainda não tem cura — diz o gastroenterologista Mazzoleni.


Em outra experiência do grupo, Mazzoleni verificou o custo social dos sintomas dispépticos, incluindo diretos e indiretos, como perda de produtividade, que chega a R$ 50 bilhões por ano no Brasil.


O que ajuda


:: Mastigar bem os alimentos, pois a digestão começa na boca

:: Fazer refeições nos horários e ambiente corretos

:: Não fazer muito tempo em jejum

:: Levantar a cabeceira da cama

:: Invistir em pratos saudáveis, com verduras e legumes

:: Exercitar-se

:: Manter o peso sob controle

:: Comer bolachas água e sal e de maisena no intervalo das refeições

:: Tomar chás digestivos, como alecrim e hortelã

:: Comer frutas como lima, banana, maçã, pêra, goiaba e mamão

:: Evitar líquidos e comidas gordurosas ou de difícil digestão antes de dormir


O que piora


:: Comer frutas cítricas, como laranja, mexerica, limão, maracujá e abacaxi

:: Mascar chiclete

:: Frituras e embutidos, como os salgadinhos de festa, salsicha, salame e mortadela

:: Condimentos fortes, como pimenta, temperos prontos, molho shoyu, catchup e mostarda

:: Produtos ricos em corantes e conservantes, como sucos em pó, sopas instantâneas e salgadinhos de pacote

:: Cafeína, presente não só no café, mas também nos chás preto e mate e nos refrigerantes

:: Medicações irritativas como os anti-inflamatórios e aspirina

:: Bebidas alcoólicas

Nenhum comentário: