THC...MAIS POLÊMICO QUE O CANABIDIOL

#UnidosSomosMaisFortes

12 de novembro de 2015 

SUBSTÂNCIA DERIVADA DA MACONHA foi autorizada em caráter liminar pela Justiça e reabriu discussão sobre seus benefícios


Depois de enfrentar meses de celeuma até a liberação do canabidiol, o Brasil está ingressando em nova polêmica sobre o uso de um derivado da maconha para fins médicos. Na segunda-feira, em caráter liminar, a Justiça Federal determinou que o tetraidrocanabinol (THC) também seja autorizado no país.

Se o canabidiol (CBD) já dividiu opiniões, com o THC o potencial para controvérsias acaloradas cresce exponencialmente. Apesar de ambas as substâncias terem estrutura química semelhante e pertencerem à mesma classe, a primeira é tida como inofensiva. Já o THC é apontado como o composto responsável pelo que a maconha teria de mais nocivo: segundo especialistas ouvidos por ZH, causa dependência e está associado a danos cerebrais.

A liminar foi concedida por Marcelo Rebello Pinheiro, juiz federal da 16ª Vara do Distrito Federal, em resposta a uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal. 

Enquanto o mérito não é julgado, o magistrado determinou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tem 10 dias para retirar o THC da lista de substâncias proibidas e autorizar sua importação para uso medicinal. 

Além disso, o juiz decidiu que devem ser permitidas a prescrição médica da substância e a pesquisa científica dos produtos obtidos a partir da Cannabis sativa, nome científico da planta.

A liminar foi concedida para que pacientes possam se beneficiar enquanto o mérito não é julgado, o que pode levar anos. 

Mas cabe recurso. Segundo a Justiça Federal, Anvisa e União podem apresentar um agravo de instrumento ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Contatada por ZH, a agência afirmou ainda não ter sido notificada, acrescentando que os “efeitos da decisão e possíveis ações da Anvisa ainda serão analisados”, o que ocorrerá apenas “no momento em que for citada judicialmente”.

ESPECIALISTAS DIVERGEM SOBRE USO MEDICINAL

Se o uso medicinal do canabidiol é bem aceito, o do THC gera muitos receios. Um dos críticos da liberação é o deputado federal Osmar Terra, ex-secretário da Saúde do Rio Grande do Sul. 

O parlamentar sustenta que, além de não ter benefícios comprovados, a substância viciaria, causaria retardo mental e desencadearia quadros de esquizofrenia.

– O efeito do THC é devastador. Ele é muito diferente do canabidiol, que não tem dano importante e pode ser que cause um efeito positivo em doenças genéticas convulsivas. 

Com o THC não é assim, ele é a substância que vicia, que causa o dano todo da maconha. Tenho certeza de que o juiz que tomou essa decisão não conhece o assunto e está mal assessorado. É uma decisão sem sentido nenhum, que passa por cima do conhecimento científico – defende Terra.

Pesquisadora do canabidiol, Nadja Schröder, coordenadora do Pós-Graduação em Biologia Celular e Molecular da PUCRS, também ressalta as diferenças e acredita que o THC possa trazer mais riscos do que benefícios.

– Assim como existem indicações de uso benéfico do THC, existem muitos estudos de consequências negativas, que seriam as mesmas da maconha: dificuldade de concentração, distúrbios de memória e até neurotoxicidade. Mesmo isolado, o THC teria efeito psicotrópico – diz ela.

O presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead), Ângelo Campana, preocupa-se com o risco de que o uso medicinal seja uma etapa no caminho do uso recreativo.

– Passo a passo, é uma forma de liberar o consumo da maconha. Primeiro vai liberando o subproduto. Com isso, a população começa a ver como remédio, como algo de pouco risco. E como a maconha fumada é mais potente, a pessoa acabará abandonando o uso via oral de remédio para fumar – observa.

De acordo com Campana, só há evidência no momento de que o THC tenha alguma ação em quadros dolorosos decorrentes de certos tipos de câncer e no alívio de contrações musculares associadas à esclerose múltipla.

– O que os oncologistas e especialistas colocam é que já dispõem de medicamentos eficazes e que não precisam disso, que não utilizariam o THC no tratamento – afirma.

As pessoas precisam para ontem”

ENTREVISTA | LUCIANA LOUREIRO OLIVEIRA, Procuradora da República

Luciana Loureiro Oliveira é um dos três procuradores da República que apresentaram a ação pedindo que o THC seja liberado. Ela falou a Zero Hora:

Por que o Ministério Público Federal ingressou com uma ação para liberar o THC?

Começamos a instruir essa questão em 2014, a partir do relato de pessoas que recorriam individualmente à Justiça para pedir a importação de medicamentos que continham canabinoides, no caso, o canabidiol (CBD). Ao longo do tempo, fomos conhecendo relatos de pacientes que tinham necessidade de outros compostos, como o THC. Percebemos que o processo de importação era muito dificultado pela Anvisa, moroso, burocrático. Algumas pessoas, no desespero, acabavam se arriscando a ser presas e a cometer tráfico de drogas, justamente porque não podiam ter importação facilitada e tinham necessidade de obter aqueles medicamentos, por indicação terapêutica.

Eram pacientes que precisavam especificamente do THC?

Alguns, sim. Conhecemos casos de pessoas que tinham necessidade do canabidiol especificamente, como aqueles que sofrem de epilepsia, e havia aqueles, no caso de dores, principalmente, que se beneficiam do THC.

Que tipos de enfermidades seriam beneficiadas pelo THC?

Nós listamos na ação uma série de doenças, fazendo referência a estudos que se debruçaram sobre o assunto e que perceberam efeitos terapêuticos positivos das duas substâncias: esclerose múltipla, doenças generativas como Alzheimer, neuropatias em geral, epilepsia. 

Nesse meio tempo, a Anvisa foi obrigada a abrir a discussão e reclassificou o CBD, mas o CBD pura e simplesmente não adianta. Para nós, foi um grande avanço (a decisão), porque acreditamos que, internamente, a Anvisa não teria feito isso.

Por que vocês pediram uma liminar para obter a liberação antes de o mérito ser julgado?

Porque as pessoas necessitam desses medicamentos para ontem. Se não há reclassificação, as pessoas têm de ingressar individualmente com um processo para importação, o que é analisado caso a caso. Se as pessoas estão sofrendo de enfermidades que causam dores crônicas, que não respondem a outros tratamentos, e têm essa prescrição, elas têm necessidade urgente.

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